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desanima a Teixeira, que aperta o cerco com mais vigor, até «que o inimigo, abátido pelo sentimento das suas perdas, foge cobardemente para o mar, levando comsigo a artilharia, e <arrasando as fortificações. Teixeira occupa immediatamente «a praça, e se dá pressa a restabelecer as obras demolidas.» *

NOTA B-PAG. 180.

Esse-Desenho-Summario-ou-Relação - de Ravardière,

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offerece tamanho interesse, como resumo de tudo o que os francezes fizeram e descobriram, e como noticia do estado do Maranhão naquella epocha;-que nos pareceu transcreve-lo aqui integralmente.

SUMMARIO DO QUE FIZ NESTAS TERRAS DO BRAZIL.

«Primeiramente tenho assegurado aos povos dos gentios, <tanto da ilha, como da terra firme, ajuntando-os, e unindo «uns com outros debaixo da obediencia do meu Rei, estor«vando-os, que não fujam de medo dos portuguezes, e reduzindo-os a tal obediencia dos francezes, qual desejar se póde. «Porque além de que já não comem carne humana em todas estas comarcas até 200 leguas de aqui, donde fenece a dos <tupinambás; e nenhum principal destes não emprehenderáõ «guerra contra outros seus contrarios, chamados tapuyas, sem primeiro lhe pedir licença, para o que lhes mandam seus agentes, ou vern elles mesmos a pedir-me a dita licença e de «proximo oito dias antes, que chegassem os portuguezes, aqui

* Tudo isto é de uma falsidade enorme. Os insurgentes não tiveram a menor noticia deste soccorro conduzido por Pedro d'Albuquerque. O naufragio deu-se no Pará, junto á ilha do Sol, e não junto a S. Luiz, e á vista do acampamento dos insurgentes, que não existia. Este segundo assedio da cidade é uma pura imaginação de Beauchamp.

<vieram tres principaes do Parà, e de Cajeté a me pedirem li. «cença para irem fazer guerra a uma nação a 400 leguas de <aqui, chamada Camarapi, sobre um rio chamado Pacajari.»

«Logo que a náu Regente foi partida, que foi em oito de dezembro de 1612, no mez seguinte mandei ao Meari, rio aqui <visinho, quarenta francezes buscar aos tabajarés, nação de «indios inimigos, que estavam 200 leguas de aqui sem haver <delles alguma noticia. Nesta primeira viagem deixaram os <meus dois indios nossos escravos na dita nação; os quaes, fi<cando no mato com mantimento para os irem a buscar, porém «feita a diligencia, se tornaram sem achar nada; e isto tenho <advertido em outras Memorias minhas, que esta nação havia «sido muito maltratada dos outros nossos tupinambás; e final«mente depois de sete, ou oito mezes, havendo feito muito mais diligencia com quatro viagens, que alli fizeram que fizes<sem os francezes, deram com esta gente, e disseram logo que havia duas castas delles desta mesma nação tabajarés, que «viviam em guerra, e comiam uns a outros cruelmente; e como «se ajuntáram a mim, vivem hoje nesta ilha em paz, e todos «juntos com os tupinambás naturaes, que antes de uns, e <outros eram inimigos. >>

«Depois tendo aviso, que havia outra nação dos tabajarés <mesmos em um rio, que a sua barra é de aqui cem leguas, «mandei ao meu Lugar-Tenente General Monsieur de Pisiaux <com 35 francezes, os quaes acharam a dita nação mais de 200 «leguas pelo rio acima, a qual se chama Vuarpi; e deixando <alguns francezes para os trazerem, vieram até ás terras de «Comat, e serão desta parte em entrando as chuvas, porque já <os principaes estão commigo, e desta mesma tenho aviso de <outra nação tapuya, chamados Igaran Vuanvã, que estavam «nas terras defronte de Pacuripanam, os quaes não desejam «mais, que chegar-se a nós outros pela noticia, que têm de <alguns escravos nossos de sua nação, os quaes lhes mandámos livres para que entendessem, que queriamos paz com todos

cos naturaes; e sobre este aviso`mandei com outros escravos calguns francezes com um lingua por nome o Mingáo, o qual cos fez vir até ás terras de Pacuripanam, e estão hoje de paz, e «mistura com os tupinambás, e fazem roças de mantimentos, em toda a paz, e amizade com aquelles, com os quaes pouco antes <havia tal guerra, que se comiam uns a outros.»

"

«Depois disto feito mandei Monsieur du Prat a um rio chamado Guajahug a 200 leguas de aqui com 30 francezes, e alguns escravos de uma Nação de tapuyas, que fica sobre este rio. A qual gente havendo navegado com imaginação certa de cos achar, ou perto, ou longe, tanta diligencia fizeram até que os «nossos linguas os descobriram,e lhes deram a entender como os quereriamos por amigos perto de nós outros; e assim os obrigaram a trabalhar em fazer canoas para se virem, e nas que ti«nham se embarcaram logo tres, ou quatro aldeas, e se vieram a esta ilha, e depois delles os demais com o dito senhor du Prat. O qual os trouxe aqui; com que me achei bem embaraçado pol'os accommodar, e sustentar juntos, que nunca quizeram dividir-se pelas aldeas dos outros, de medo de que os não comessem, como tinham de costume. Entonces me resolvi de largar uma aldea, que tinha de minha gente a uma legua daqui, «e os mandei aposentar nella, fazendo sahir os meus; e lhes dei ⚫todas as roças de mandioca para seu sustento, e elles me prometteram fazer-me outras; e ainda que já por este anno é «tarde, será ao outro com o favor de Deus, se a terra nos fica «cómo espero. De mais disto tenho mandado vinte e cinco francezes com um dos meus escravos, principal de sua nação, a buscar uma de tapuyas 250 leguas dentro do rio Pará, que «são em tanta quantidade, que me offerecem cem canoas grandes, como os principaes me têm promettido, aos quaes eu fallei em Parijop sobre a terra dos pacajazes, quando fui ás «Almazonas: aguardo por esta gente no mez de maio, se não <tiverem algum estorvo, esperando recado meu. Pois hãode saber, que estão ja aqui os portuguezes. Os quaes se tardassem

VOL. II.

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mais um ou dois annos, já tinha dado ordem, para que se «ajuntassem aqui comnosco mais dez outras nações, que entre «ellas ha uma sobre um rio da nossa bahia, que é maior «nação, que toda a dos tupinambás. »‹

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Não digo o numero das viagens, e caminhos, que tenho feito, «e mandado fazer em estas terras, e rios pelos meus; nem digo «da minha viagem, que quiz fazer ás Almazonas; porque ficou «imperfeito pela vinda a esta terra de Martim Soares Moreno portuguez, que veio a descobrir estas terras, e bahias do Ma«ranhão no mez de agosto de 1613 de parte de Jeronymo d'Albu «querque, que em ella está presente, como parece em nossos «artigos de paz. De mais disto tenho mandado fazer quatro <«<fortes sobre as principàes partes, e portos desta ilha, donde <«em todos tenho artilharia, principalmente em este de S. Luiz, «donde tenho muita quantidade: não ponho aqui minhas penas, «e trabalhos, e perdas que tenho corrido indo, e vindo 300 leguas desta costa dentro em uma canoa, atravessando as «barras, e bahias, e dobrando as pontas de todas ellas no tempo das brigas, nem fallo em tres crueis, e compridas enfermida«des, que me causáram estes trabalhos; porque quem quizer considerar tudo isto, e julgar com igualdade, rogará a Deus, que « gratifique, e nos sustente em paz dentro no nosso mundo «arctico. Feito no forte de S. Luiz no Maranhão a 29 de dezembro de 1614.

LA RAVARPIÈRE.

Além das noticias do - Summario-o proprio Diogo de Campos colligiu outras, que posto que inexactas ou exageradas em parte, são dignas comtudo de vulgarisação. Ei-las:

Além destas informações, e papeis, vio o dito sargento-mór «as terras da ilha, eroças de algodão, de que os francezes tirão algum proveito, e o tabaco, ou herva sancta, do qual fazem «quantidade com tão boa tempera, que val huma livra em

França hum escudo de ouro. Tambem vio a canafistola do rio Meari, da qual levão a França quantidade em conserva, e secca. Tambem vio as perolas, que Mons. de Pisiaus trouxe do rio Zouarpi, que são maiores, que grãos, e da feição de cabacinhas algumas, em que vio huma mui grossa. Tambem «trouxe Mons. de Pisiaus desta sua jornada enxofre mineral, o qual asseguram que se não acha, senão donde ha minas de ouro, ou prata, e para isto fizerão vir de França na nau Regente hum capucho, grande mineiro, chamado F. Hivo, o qual adoeceu de sorte na ilha do Maranhão, que não pôde ir ás Minas, antes por não perder a vida, se tornou a França.

O Cavalheiro de Rasilli da Ordem de S. João, e seu irmão Mons. de Lone, e o Senhor de la Blanjartière, e outros fidalgos aprendem, e fallão a lingua dos indios, obrigados de esperanças, que ninguem declara, e todos as confessão; e assim vão lançando mão de todas as miudezas, que achar podem, fazendo caso da tinta vermelha do orucú, e da outra mais fina cha«mada carajorú, e do páo amarello chamado tatajuba, e de todas as madeiras, que de diversas côres achão para se poder fazer obra, ou tinta. Tambem no rio Meari tem descuberto sa<litre, com que já hoje refinão sua polvora, e isto de minas, e «terra salitrosa, que o dá em grande abundancia: tem da mesma maneira descuberto maravilhas naturaes de sal mui perfeito em quantidade, que podem carregar quantos navios «quizerem, o qual está 40 leguas do forte S. Luiz da outra banda «da terra firme de loeste.

Tem estas terras muita almessega, de que se valem, muito, «e mui fino insenso, do qual ha huma especie de arvores, que dão tanto, que bream com elle os navios, e canoas. Tem infi«nito oleo de copaiva em toda esta costa, de que os francezes «tirão a quinta-essencia para suas mesinhas, e fica como agoa. «Tambem nestas partes dizem, que a temporadas acham muito ambar-gris, e o anno de mil e seiscentos e dez achou hum «francez, soldado de la Ravardière, por nome Mons. de Bault,

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