Page images
PDF
EPUB

Quando não, tenebroso cahos fica
A tão suave exploração das plantas.

Não desprezo Jussieu; seu genio vasto (3) Do sceptro de Linneo quebranta a força: Mas assustam-me novas Dynastias, Departamentos novos que supprimem Das Provincias os nomes conhecidos; E, sem nada augmentar, confundem tudo.

Observou bem Jussieu os caracteres Essenciaes, constantes; vio aquelles, Quasi uniformes; menos necessarios, Finalmente nas plantas, vio quaes eram ; Ora constantes, ora variaveis,

E de diversos orgãos procedidos.

Estas tres divisões, simplices, bellas,
Teem resultados grandes; sejam regra
Embora dos Botanicos futuros :
Eu, recream-me velhas Monarchias,
E as classes de Linneo vou contemplando.

Doce Hypicaris! (+) Se onde o Fado acerbo Te poz, longe de mim, chegam meus versos; Se lá chegam tambem os meus suspiros; Lê, medita, perdoa; que a innocencia Um só modelo tem: esse que salva A raça humana ingrata, e que a desculpa. Volta os olhos celestes deste lado, Repara nos jardins; no arbusto lindo

(*) Hoje Condessa de Stroganoff, na Corte da Russia.

De cujo verde berço surge a Rosa,
E com fragrancia e côr suave applaude
O Sol que dos Ceos manda a Primavera.

De um calix tubuloso vem nascendo
Este primor que na Icosandria reina; (4)
Contêm da adolescencia as graças todas:
Rica d'estames, rica de corolla,
Triumpha nos jardins das flores todas.
A Natureza, concordando co' a Arte,
Variou desta flor as formas bellas,

E augmentou pelo enxerto os seus primores.
N'uma roseira mesma seis diversas (5)
Filhas de Flora os ares embalsemam:
Simples, dobres, vermelhas, amarellas,
Carmesins, matizadas; co' a mistura
Das especies se cria a variedade.

Como tributo á Deosa da Belleza A Grecia culta consagrava as Rosas : A Poesia as pétalas lhe tinge

C'o puro sangue do gentil Adonis:

Seu grato aspecto em toda a parte inspira
Certo pensar que se refere ao culto.
Até mesmo no altar, no templo augusto
Dos Hebreos, o supremo Sacerdote

Uma c'roa de rosas lhe cingia

No sacrificio a veneranda frente.

Foram symbolo e premio da innocencia ;

E a profana ambição quiz, por inveja,
Que servissem d'insignia a seus projectos.

Ah! Se as flores sentissem como eu sinto, E essas lutas sanguineas recordassem, Nas quaes foram signal da morte as rosas, Murchariam de dôr: talvez murcharam. Falta-lhe a graça, falta-lhe o perfume Neste terreno, que inundava o sangue Pela rosa vermelha ou pela branca. (6)

A sylvestre roseira, o cynorrhodon (7) Mais simples, mas formosa, na charneca, Na floresta e vallados tambem cresce. Seus severos espinhos afugentam Quem pertende tocar-lhe; menos bella Que a rosa dos jardins, quasi que a vence Em fructos de coral que o campo adornam.

Prodiga Flora, nas especies varias, Umas com pompa levantou da terra, Outras humildes, mas gentis, a enfeitam.

Pouco é ser bella: a rosa esqueceria, Se depois de reinar sobre as latadas, Murchando-se, cahisse desfolhada. Mil propriedades juntas á belleza Realçam nella a pompa de seu traje, E os applausos que attrahe com seus efluvios.

Com seus dons renascer faz a saude; A Medicina, as Artes lhe consagram (8) Cultos por util, como os tem por bella.

Sede assim, Formosuras negligentes:
Uni virtude aos seductores gestos;
Ou temei a estação que as flores secca.

Vede com susto o Tempo enverrugado,
Que as tediosas horas vem trazendo
Para em fim castigar vossos descuidos,
E as graças abysmar no esquecimento.

Em coro as aves, festejando as flores,
De ramo em ramo, no pomar gorgêam.
Alli com media altura se levanta
A Cereijeira, cujo fructo lindo

São globos de rubim com que Lucullo (9)
Brindava as mesas nos festins d'Europa.
Do fragil ramo as lanceoladas folhas
Cêdo apontam, profusamente nascem.
Immensas, alvas flores que revestem
As hasteas longas, promettendo os fructos.

Com quanta gala o mez de Maio adorna A guapa Macieira! Alli disputa, Co' a rosea flor em molhos, a elegancia Do matiz purpurino ao Pecegueiro: Crebros ramos estende, e as verdes folhas Aveludadas, brandas, move o vento.

Se das ordens troquei affouta a serie, E a Rosa me entranhou na Polygynia, (10) Não foi erro a belleza impera e guia O coração, a voz, o pensamento.

Outras plantas começam da Icosandria
O apparato pomposo; e são taes plantas
Do Agricultor recreio, estudo e ganho;
São pelo enxerto origem de riqueza.
E, ou vegetem nas selvas sem cultura,

Ou nos pomares soffram força d'arte,
O Genio jardineiro as associa,
E especulando, mil proveitos tira.
Nos banquetes pyramides s'elevam;
Jaspeados cristaes conteem liquores;
Vinhos, conservas, saborosos doces
Transformam estes fructos, e contentam
Dos avidos Apicios o appetite. (11)

A Fragaria cheirosa, que procura, (12) Bem que humilde, ganhar sempre terreno; E vós, plantas gentis e saborosas,

Que um lugar mereceis nestes meus versos,
Prestai graça e sabor a meus escriptos.
Os habitos, a forma e caracteres
Da Icosandria e mais classes investigo.

Fixos no calix, crescem os estames, (13) Das pétalas fieis sempre amparados; São destas flores a feição distincta. Na Polyandria numerosos nascem, E sobre o receptaculo repousam. Formam cinco jardins, diversas ordens, E em cada qual, com formas singulares, O prado esmaltam as diversas flores.

Quantas vezes, meus olhos illudidos, O Cisto julguei ser filho da Rosa! Numerosas especies desta planta Convidam o amador da Natureza A contemplar seus dons e a aproveitá-los.

O lusitano Cisto nasce e morre,

« PreviousContinue »